segunda-feira, 29 de junho de 2009

MICHAEL JACKSON, APENAS MAIS UM BRASILEIRO

Tuca Hernandes

Era uma noite de quinta-feira bem atípica: Michael Jackson tinha acabado de falecer. Apesar de não ter ficado surpreso com a notícia, por achar que o cantor já estava numa espécie de sobrevida pela aparência cada vez mais fragilizada, eu me comportei como boa parte da população mundial, ao não tirar os olhos da televisão e do computador. Cada fato que surgia funcionava como uma pitada de fermento que só ia aumentando a minha curiosidade sobre o episódio.

Quase perto das nove da noite, recebi um e-mail que me deixou intrigado. Era de um homem que se apresentava como Marcos, dizendo que gostaria de falar comigo a respeito das manchetes do momento. Explicava que pretendia desabafar, uma vez que era um leitor antigo do meu blog, apesar de nunca ter comentado nele. Para demonstrar que falava sério, deu o número de telefone de sua casa. "Pode ligar a cobrar", destacou na mensagem, sinalizando mais ainda a necessidade de falar comigo. Apesar de desconfiado, resolvi entrar em contato, enquanto a televisão continuava sintonizada no canal de notícias.

Ele atendeu já no primeiro toque. Depois de me agradecer pelo retorno, parecendo bem ansioso, o cara pediu para que eu fosse até o apartamento dele, no bairro de Pinheiros. De imediato, recusei o convite. Como que um estranho vem me fazer um convite desse nível, naquele horário? Ele me assegurou que não iria tentar nada contra mim. Queria apenas fazer revelações que tinham a ver com o Michael Jackson. Para tanto, preferiu a mim ao invés de falar com alguém da imprensa, pelo tempo que lia o meu blog. "Pode acreditar, você é como um amigo para mim, é sério." Movido pela curiosidade, eu disse que iria encontrá-lo, mas com uma condição: que alguém de minha confiança fosse junto comigo. Apesar de contrariado, ele concordou. Chamei o Oliveira, vizinho e amigo meu que era investigador da polícia civil. De folga e devendo alguns favores pra mim, ele topou me acompanhar, resmungando um pouco por causa das últimas novidades que ele iria perder sobre o Michael Jackson. Paciência.

Com o endereço em mãos, fomos andando para o local do encontro, que ficava a algumas quadras do nosso prédio. O próprio Marcos nos recepcionou no apartamento dele, que ficava em um desses típicos prédios para famílias da classe média. Ele era um mulato meio gordo e simpático, dessas pessoas que vivem rindo. Para quebrar o gelo, o homem começou o papo comentando sobre alguns posts meus. "Rapaz, aquele que você fez sobre o Zé Pamonha... Que doideira, hein? Gostei bastante! E o das dicas pra mulherada arranjar namorado? Curti também!" Após minutos de conversas sobre posts e outras amenidades, ele me perguntou se era possível conversar a sós comigo, no quarto que servia como escritório. Olhei para o Oliveira, que imediatamente fez um sinal de positivo, enquanto afastava de leve a jaqueta, deixando a arma na cintura em evidência, indicando que, sim, tudo bem. Ele ficaria ali na sala, assistindo o canal de notícias. Qualquer coisa, já sabe.

Aquele homem tinha um leve sotaque, cuja origem não consegui reconhecer, de tão sutil que era. Por certamente perceber a minha curiosidade sobre isso, ele iniciou o nosso papo particular dizendo que era americano. "Mas e o nome?", perguntei. "Marcos? Bem, aqui no Brasil, resolvi me tornar Marcos Gerson. Entendeu aonde quero chegar?" Não, não tinha entendido. Ele continuou. "Foi o nome que julguei ter mais a ver com o que eu tinha lá nos Estados Unidos. Entendeu agora?" Eu ainda continuava a não entender. Ele suspirou fundo e disse, com um ar solene: "Marcos Gerson, Michael Jackson... Prazer, Michael Jackson." Como assim? "Não vejo nada de mais em alguém ter o mesmo o nome do astro que acabou de morrer", comentei. Rindo alto, ele finalmente foi direto ao que interessava: "Meu amigo, eu sou o Michael Jackson. Aquele mesmo, que começou a carreira no Jackson Five. That's me, man!" Não era possível, e aquele cara que agora devia estar num necrotério de Los Angeles? Com um gesto que pedia um pouco de paciência minha, ele começou a explicar toda a história.

"Era agosto de 1983, quando o Thriller ainda liderava as paradas de quase todo o mundo. Numa bela tarde, enquanto uma multidão de fãs surtadas chacoalhava a minha limusine, eu comecei a achar tudo aquilo um enorme pé no saco. Essas paradas estavam me sufocando, do you know what I mean, man? Naquele momento, me dei conta que eu já vinha pirando há algum tempo já. Acredita que, naquele ano, eu fiz cirurgia plástica no nariz só pra que ele ficasse idêntico ao da Diana Ross? Fininho, sabe? Nessa época, eu já vinha considerando a possibilidade de jogar óleo quente nos meus olhos, só pra ficar cego que nem o Stevie Wonder. Cheguei muito perto de fazer isso, acredita? Além dessas doideiras, tinha o bando de sanguessugas que ficava puxando o meu saco o tempo todo. Você não faz idéia como eu odiava tudo isso, man! Eu não estava nada bem. Tinha chegado no meu limite. Foi aí que resolvi cair fora dessa palhaçada de show business, pra sempre. Chega! Game over!"

Mas... e quanto ao Michael que morreu hoje?

"Eu gostava muito de Beatles e me lembrei daquela lenda de que o Paul McCartney tinha morrido em 1966. Que, no lugar dele, colocaram um impostor perfeito, que era praticamente uma espécie de irmão-gêmeo do cara, tanto no físico quanto no talento. Taí, vou fazer isso também, pensei. Como eu estava vivo, resolvi que fugiria para um lugar isolado, deixando um sósia no meu lugar. Alguém que realmente acreditasse que fosse o Michael Jackson. Meses depois, já no começo de 1984, conseguiram encontrar esse sósia, um rapaz idêntico a mim e que estava num hospício do Mississipi, dizendo para todos que ele era eu. E o figura cantava e dançava feito eu, impressionante. Figuraça! O melhor cover que poderia existir. Perfeito, pensei. O cara tem todas as habilidades e já pensa que sou eu, então vai esse mesmo. Daí, caí fora de vez, não sem antes fazer uma plástica que deixou o meu nariz do jeito que era, mais achatado. Peguei uma grana, coloquei pra render num banco da Suíça e deixei o figura lá me representando para sempre. Fui viver numa ilha do Pacífico, junto com uns nativos bem primitivos que não tinham a menor idéia de quem eu era. Maravilha. Cinco anos depois, ao ver umas fotos atuais do outro Michael Jackson, numa revista que apareceu na praia, percebi que eu já poderia voltar para a civilização. O rosto e o corpo daquele cara já não tinha mais nada a ver com o meu. Daí, decidi vir morar aqui, em São Paulo. Vida nova, man! Marcos Gerson! Pra provar que eu sou o Michael original, dê uma olhada nas coisas que estão nesta caixa..."

Ele ficou durante quase uma hora me mostrando vários documentos, como passagens de avião, fotos da família Jackson, agendas, filmagens particulares dele na privacidade de sua mansão, essas coisas. Comecei a olhar para ele com mais atenção. De fato, apesar de meio gordinho, aquele homem tinha feições que lembravam bastante as daquele rapaz do início da década de 80, responsável por uma série de sucessos que marcariam gerações. Era ele mesmo, concluí. Michael Jackson não estava morto. Levava uma vida de cidadão classe média em São Paulo, no bairro de Pinheiros, sobrevivendo com a grana que pegara anos antes. Divorciado duas vezes, ele saía atualmente com uma morena que, segundo ele, "tem uma bunda que faria o Obama renunciar à presidência". Não teve filhos por não suportar crianças, razão pela qual se submeteu a uma vasectomia, pouco antes de abandonar os EUA. E quanto à série de esquisitices e escândalos que o Michael morto havia protagonizado? O que o Michael vivo achava disso tudo?

"Rapaz, aquele ali forçou a barra. Pirou mais do que eu poderia imaginar. Aquelas mudanças no rosto, man, achei assustadoras. Tudo bem que me ajudaram a ficar mais anônimo ainda por aqui. Mas, putz... O figura exagerou na dose, foi demais. Quanto ao comportamento dele com a criançada, sei lá se ele fez tudo aquilo mesmo. Quer saber a minha opinião? Eu acho que não. O doidinho era gente boa, todo inocentão, sabe? Delicado e confuso, tadinho. Fiquei triste pelo que aconteceu com ele. Esse fim, man... Muito triste. Por isso que eu precisava desabafar com alguém, entendeu? No fim das contas, se não fosse por mim, o branquelinho não teria vivido nada disso. O rapaz sofreu muito. Muito mesmo. Tô péssimo com tudo isso, man!"

O Michael Jackson começou a chorar na minha frente, atormentado por uma culpa que o vinha atingindo há tempos, toda vez que tinha conhecimento de mais uma notícia sobre a decadência do Michael que ficara nos EUA. Portanto, era mais do que compreensível aquele choro, considerei. O consolei dizendo que a vida é assim mesmo, impossível de se prever o que virá pela frente e que, naquele momento, o mais certo seria agir como o cara que negava a paternidade do filho da Billie Jean. Aquele problema não era dele e ponto final. Aos poucos, ele foi se recompondo, tanto que, em questão de minutos, o assunto era novamente um de meus posts. "Você quase me pegou com aquela história da Geléia de Banana Santa Gertrudes. Tomei um susto, rapaz! Você, fazendo esse tipo de coisa? hahahaha"

Ao nos despedirmos, combinamos de marcar alguns chopps para os dias seguintes. Percebendo que o Michael ainda continuava um pouco chateado com os acontecimentos daquela noite, coloquei as mãos nos ombros dele, olhei nos olhos, e disse, emocionado: "Marcão, bola pra frente, cara! Você criou o passo Moonwalk! Você é o cara, Marcão! Não se esqueça disso. Você é o CARA!"

No elevador, o Oliveira perguntou o que tinha sido aquilo. "Bobagem, cara... Bobagem, liga não. Deixa pra lá", respondi, encerrando o assunto ali mesmo. E fomos embora, vez ou outra arriscando uns passos moonwalk na calçada, enquanto continuávamos assoviando o refrão de Billie Jean. Grande Marcão!

2 comentários:

Cris Vianna disse...

cara, você me fez rir com esta história. Que imaginação!!! Seria um final menos trágico para o rei do pop.

Anônimo disse...

que lixo

 
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