sexta-feira, 29 de maio de 2009

Copa de 2014 – Bombas de efeito imoral.

Carlos Fialho

Em uma das cenas do filme “A Queda – As últimas horas de Hitler”, Eva Braun, mulher do ditador, organiza uma festa num salão enquanto Berlim está sendo bombardeada pelos aliados. Ela queria passar para as pessoas a falsa impressão de que tudo estava indo muito bem a despeito das explosões que se ouviam. Até que uma bomba caiu no salão e todas aquelas pessoas perceberam que viviam uma grande mentira.

Ultimamente tenho lembrado constantemente desta cena como alegoria da candidatura de Natal a uma das sub-sedes da Copa de 2014. É claro que nós queremos participar da festa, usufruir dos investimentos público-privados que beneficiarão a cidade, viver um clima de Copa do Mundo aqui mesmo na cidade, mas por que precisam mentir tanto pra gente? Por que precisam nos fazer palhaços com tanta frequência? Por que não admitir que as bombas caem lá fora enquanto dançamos ao som de Banda Grafith aqui dentro do salão?

Sexta passada fui ao Machadão. O mesmo que será demolido para a construção da Arena das Dunas. O que eu vi mais uma vez? Um estádio que atravessa décadas de descaso e obras de maquiagem. Sempre que vou ao estádio, fico procurando os R$ 17 milhões investidos pelo então prefeito Carlos Eduardo e sinto extrema dificuldade em encontrá-los. Foram investimentos na infraestrutura, me explicam pessoas mais esclarescidas, obras necessárias para que o estádio não caia, como aconteceu com a Fonte Nova em Salvador. Tudo bem, explicações dadas. Mas, vem cá: não dava pra ter estruturado minimamente os banheiros para que o torcedor não tenha seus pés embebidos em xixi a cada vez que precise usar o banheiro?

E a nova Prefeita que promete fazer das tripas coração, mover mundos e fundos, dar tudo de si, para que Natal esteja pronta, e não é capaz de solicitar um placar para o estádio. E nem precisa ser eletrônico não, porque nós torcedores, que estamos em petição de miséria, nos contentamos com um placar manual, a manivela, enfim, qualquer um que a FENAT tenha a boa vontade de conseguir para nós.

Um exemplo de como o poder público zomba de todos nós foi o que fizeram com o arquiteto Moacyr Gomes da Costa. Ele foi convidado para apresentar na CBF um estudo de adaptação do Machadão a todas as normas exigidas pela FIFA para a realização de um jogo internacional. Vale lembrar que a Alemanha só precisou construir dois estádios para realizar sua Copa e que a França só ergueu uma única arena em 98. É claro que as estruturas deles são mais bem cuidadas, em virtude do zelo que eles têm pelo seu patrimônio, o mesmo zelo que justifica a não demolição/reconstrução da maior parte de seus estádios.

O fato é que, enquanto o arquiteto potiguar apresentava seu projeto de adaptação do Macahadão, que custaria muito menos aos nossos bolsos de contribuinte e seria suficiente para que tivéssemos uma praça de esportes decente e de sentir orgulho, o Governo do Estado encomendou um outros projeto que custou R$ 3,6 milhões a uma empresa norte-americana que contempla a demolição e reconstrução do Machadão. Em suma: mentiram descaradamente para o arquiteto potiguar e o usaram, enquanto ganhavam tempo para terem uma outra carta na manga muito mais dispendiosa e, sabe-se lá Deus se necessária.

Mentiram para o senhor Moacyr assim como mentem para todos nós, mas a maior distorção dessa história toda é que eu não vi nenhuma declaração de político, seja a governadora, a prefeita ou o deputado micareteiro que, cada vez mais, tem certeza de que somos um bando de otários, que falasse em promover o ESPORTE DA CIDADE, em transformar Natal em uma referência em formação de atletas, em inclusão social através da prática de atividades. Nossos projetos têm o objetivo de construir estruturas, mas cadê os projetos para construir cidadãos? Querem erguer um complexo esportivo de primeiro mundo, mas vão colocar QUEM pra jogar lá? A nossa letargia e insensibilidade é tão gritante que os políticos nem cogitaram essa hipótese. Não seria natural que aproveitássemos o “efeito Copa” em benefício real dos nossos cidadãos e da sociedade em geral?

Enquanto isso, as bombas caem lá fora. A bomba dos remédios estragados pela administração anterior, a bomba da insegurança pública e dos problemas viários, a bomba da educação que parece sem solução possível. Elas vão explodindo e nós, como bons natalenses que somos, vamos repetindo o nosso mantra: “Me engana que eu gosto!”

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